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Chegamos finalmente a última parte dessa longa viagem através da história dos quadrinhos brasileiros. Agora acompanharemos os principais acontecimentos no novo milênio e como as obras nacionais têm se virado em um mercado cada vez mais dominado por obras estrangeiras e onde apenas a Turma da Mônica segue firme e forte no mercado tradicional. 

Anos 2000: os quadrinhos brasileiros ganham a concorrência dos mangás 

Em meados dos anos 90, o Brasil viu o fenômeno “Cavaleiros do Zodíaco” tomar conta das TVs e trazer diversos animes no embalo. Os mangás, que na grande maioria dos casos inspiram essas animações, pareciam ser só questão de tempo para chegar também. No entanto só começamos a ver uma grande quantidade desembarcando aqui no começo dos anos 2000. 

As editoras responsáveis por muito tempo foram a Conrad (que trouxe de cara Cavaleiros e Dragon Ball) e a JBC, sendo que esta trouxe os mangás com o mesmo papel jornal das produções japonesas. A única diferença destes para as obras originais é que no Brasil eles dividiam uma edição oriental ao meio, ou seja, a cada duas equivalia a uma de lá. 

Enquanto isso tivemos o lançamento de Combo Rangers, que foi a primeira obra brasileira lançada na internet. Posteriormente a própria JBC trouxe ela para o formato físico entre os anos de 2001 e 2002. Após ser descontinuada, ela ganhou vida nova, mas agora pela Panini, onde foi publicada entre 2003 e 2004.  

As profundas mudanças editoriais no começo do século XXI 

A década de 2000 foi sem dúvida muito movimentada para os quadrinhos brasileiros, mas nem sempre de forma positiva. Tivemos por exemplo o encerramento do estúdio Disney pela Abril Jovem, o que significou o fim das histórias produzidas aqui no Brasil. Elas passaram a ser importadas da Itália e EUA. 

Tivemos também uma tentativa frustrada da volta do “Pequeno Ninja” em 2002, mas em estilo mangá. A revista havia sido interrompida por uma briga judicial entre a editora e os criadores, só que quando ela voltou não teve mais o mesmo sucesso do começo dos anos 90. Ainda tentaram novamente entre 2007 e 08, já no estilo original, entretanto não foi adiante. 

Tivemos também a editora Abril abandonando o “formatinho” (aqueles que vemos normalmente os gibis) e trazendo revistas da Marvel e DC no formato americano. Contudo o alto preço cobrado na época, fez com que o sucesso fosse muito abaixo.  

Posteriormente, ambas as publicações passam para as mãos da Panini, editora italiana que tinha parceria com a própria Abril. Ela compra a parte da editora brasileira e passa a publicar sem intermediários (apesar da distribuição ser da DINAP). Apenas em 2005, quando a Ediouro desiste dos selos Vertigo, Wildstorm e America’s Best Comics, que todas as obras da DC ficam em suas mãos. 

Vale destacar também que surgiram diversas produções na linha informativa de hqs, animes, mangás e até RPGs (como a Dragon Slayer). Por fim, também voltamos a ter publicações adultas com o selo “Xanadu”, que contava com quadrinhos eróticos clássicos e também hentais (a versão japonesa).  Ambas tiveram vida longa, passando de 100 edições.

Turma da Mônica vai para Panini, fim do Menino Maluquinho e o encerramento das atividades da Editora Globo no ramo de quadrinhos 

A metade final desta década trouxe algumas movimentações importantes. Primeiramente, visando tornar a Turma da Mônica internacional, Maurício de Souza a leva para a Panini. Um ano depois, em 2008 inicia a produção da “Turma da Mônica Jovem”, que traz os personagens mais velhos e com um estilo mangá.  

O ano de 2007 também marcou o final dos quadrinhos do Menino Maluquinho, que estrearam ainda em 1989. Voltando para 2008, este marcou o encerramento do setor de quadrinhos da Editora Globo. Encerrou-se um ciclo que começou em 1937 e que teve inúmeras publicações sob seu selo.  

Os quadrinhos brasileiros perdiam uma importante editora e passavam por um período de baixa. Tanto que tivemos o ProAc (Programa de Ação Cultural) e também projetos na câmara visando estabelecer cotas para quadrinhos brasileiros.  

Década de 10: os artistas brasileiros ganham o mundo 

A virada da década trouxe um cenário complexo para os quadrinistas brasileiros. Primeiramente com o oligopólio formado pelas HQs estadunidenses/mangás/Turma da Mônica, com esta última sendo a única “intrusa” entre os estrangeiros. Contudo a própria presença dela também tirava um pouco o espaço para novas obras nacionais, especialmente infantis. 

Só que mesmo em um cenário aparentemente desfavorável, os quadrinistas brasileiros conseguiram se reinventar e buscar espaço, mesmo que fosse lá fora. Um dos primeiros casos de sucesso foi da dupla Fabio Moon e Gabriel Bá. Juntos e pelo selo Vertigo da DC, eles publicaram a obra Daytripper, que até hoje é uma das mais lidas da editora. 

Publicada fora do país (foi lançada inteiramente nos EUA), a minissérie de 10 capítulos foi vencedora de prêmios como o “Prêmio Eisner”, “Harvey Awards” e também o “Utopiales” (prêmio francês). Muitos Quadrinistas começaram a desenhar para as gigantes Marvel e DC, mas normalmente iniciavam suas carreiras pela Dark Horse. 

Com o tempo, as próprias começaram a importar artistas daqui, sendo comum nos dias de hoje encontrarmos artistas brasileiros desenhando os principais heróis das Comics. Entretanto não foi apenas nos EUA que um brasileiro conseguiu destaque.  

Sob o pseudônimo de “Yuu Kamiya”, o mangaká brasileiro Thiago Furukawa Lucas foi o primeiro a conseguir fazer sucesso no Japão. Primeiramente sendo o ilustrador da light novel “Itsuka Tenma no Kuro Usagi”, ele conseguiu real fama ao lançar uma história de sua própria autoria. Chamada “No Game, No Life”, ela foi lançada em 2012 e ganhou até mesmo uma versão anime e um longa. 

Os quadrinhos brasileiros e as produções independentes

Já no Brasil, com a internet cada vez mais tomando espaço das obras físicas e com os leitores de revistas e até de quadrinhos caindo, os artistas nacionais tinham dificuldade para emplacar obras em grandes editoras. A opção de muitos passou a ser financiamentos coletivos ou então pequenas editoras. 

Tivemos o caso da obra “Achados e Perdidos” da dupla Eduardo Damasceno e Luis Felipe Garrocho, que foi a pioneira aqui em fazer financiamento coletivo na plataforma Catarse. Atualmente ela é uma das que mais tem projetos em andamento no país, apesar de termos outras no mesmo estilo, como a Kickante e “Apoia.se”. 

Começamos a ver as Graphic Novels (ou “romances gráficos”, obras desenhadas em formato de livro) ganhando espaço aqui. Tivemos obras como “Adormecida: Cem anos para sempre”, “turma da Mônica: Laços”, “Tungstênio”, entre muitas outras com destaque no mercado brasileiro. 

Quadrinhos brasileiros ganham espaço no prêmio Jabuti 

O principal prêmio brasileiro de literatura, que ocorre desde 1959, o “Prêmio Jabuti” não contava com nenhuma premiação específica para quadrinhos. Tal fato sempre rendeu muitas críticas à organização, que acabou criando a categoria após um abaixo-assinado capitaneado pelos quadrinistas Wagner Willian, Ramon Vitral e Érico Assis. 

Com mais de duas mil assinaturas e apoio de diversos nomes importantes da área (como Laerte, Marcelo D’Salete e Rafael Coutinho), a premiação começou em 2017 e desde então premiou as seguintes obras: 

  • 2017 – Castanhas do Pará (Gidalti Oliveira Moura Júnior). A curiosidade é que justamente a primeira premiação foi de uma produção independente; 
  • 2018 – Angola Janga (Marcelo D’Salete) pela editora Veneta; 
  • 2019 – Jeremias: Pele (Rafael Calça e Jefferson Costa) pela Panini e Maurício de Souza Produções; 
  • 2020 – Silvestre (Wagner Willian Menezes de Araújo) pela editora Darkside. 

Pode-se dizer que os quadrinhos brasileiros como sempre conseguiram dar um jeito de manter seu espaço. Apesar de hoje eles não estarem necessariamente em grandes editoras, as possibilidades de financiamento, produções independentes, junto a eventos como Bienal, CCXP possibilitam que eles mostrem seu trabalho.

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